Conhecendo nossas origens
Um mapa é sempre uma representação de desbravamento de alguma região. Em nosso caso, traçamos registros de nossa música e nossa gente de uma forma sonora.
Através da nossa história secular compomos e escrevemos o que temos de mais original, no falar, no ouvir e no viver do Brasil Colonia e do Brasil Império e é com essa fonte incessante, pelo particular, que a Mala do Folclore colabora conosco e apresenta os ritmos Chula, Samba - Rojão, Samba de Terno.
CHULA
Chula
Amarantina; Chula de Santa Cruz; Barqueiros e "Paus”. Estas são apenas
algumas das versões da ‘Chula' que percorre as margens do Douro e se estende
até ao Minho. Atrai para os átrios das igrejas, os que gostam de bailar e
sempre que chega o Natal, aproveita-se para comemorar com umas "Chulalas".
Pedro Homem de Mello caracterizou-a como uma
"dança complicada, rica e subtil onde certos saltos evocavam modas
escandinavas." Houve tempos em que os trabalhos agrícolas, como as mondas,
as desfolhadas ou as espadeladas do linho eram pretexto suficiente para puxar
da concertina, da viola ou da rabeca e dar ritmo aos movimentos. Eram serões animados
pelas Modas criadas à medida do carácter do minhoto, para quem
"dança" é impreterivelmente sinónimo de alegria. As próprias letras
das canções fazem a isso referência e, se alguém tiver duvidas, basta ouvir com
atenção um excerto da 'Chula d' Areosa": 'hei-de cantar; hei-de rir;
hei-de ser muito alegre; hei-de mandar a tristeza; pró diabo que a leve...
As romarias eram outro bom pretexto para se
dançar as “Chulas". Eram criadas com letras e coreografias um pouco
diferentes consoante a localidade em que surgia. Mas cada freguesia defendia a
sua, com brio e vaidade. É igualmente uma dança de roda, mas o porquê do nome
não está esclarecido. Hoje os serões minhotos são preenchidos de forma
diferente. Os processos mecanizaram-se e a intervenção do homem nas tarefas
agrícolas foi minimizada. Agora, quem dança as 'Chulas' são os grupos
folclóricos que foram surgindo ao longo dos anos, trajados á moda do Minho e
ornamentados com as relíquias em ouro.
As Chulas são as únicas rainhas das danças do
norte. Descemos ao Baixo Minho e entramos no reino dos "Malhões”, o
ambiente é de folia e animação. É conhecido como "Malhão Velho”. “Malhão
Minhoto” ou simplesmente "Malhão". A dança começa quando os pares
dispostos em círculo, se voltam para dentro dando a direita à moça. Depois de
irem dançando em “Passo de Chula", e de o mandador dar ordem, eis que se
inicia o "Voltear". É executado em cinco tempos, durante os quais os
pares volteiam sobre si em passos mais largos. No final deste movimento surge o
característico "Pulo" a “Pé-Coxinho".
Para alguns interessados nestas matérias, esta
será uma dança campestre que terá surgido no distrito do Porto. O nome de
"Malhão" terá tido origem em algum instrumento agrícola e nos tempos
em que era dançado nas aldeias, tinha uma coreografia diferente, mulheres e
homens dispunham-se em fila, frente a frente. Iam-se aproximando e afastando
sucessivamente e batiam o ritmo com os pés. O fim da dança acontecia quando
todos fechavam a roda e pulavam. Curioso é, no entanto, o testemunho dos mesmos
autores para os quais a dança tomou um rumo e uma conotação bastante diferente
depois de ter passado do campo para a cidade, pois dizem que a dança foi
“adoptada nas orgias e bacanais do povo rude". Porém, esse significado foi
ultrapassado e hoje o "Malhão" é dançado sem preconceitos.
(Fonte:
Semibreves, MUSICA TRADICIONAL PORTUGUESA.)
SAMBA – ROJÃO – Rojão da viola. Há duas
acepções. A forma velha que conheci no sertão ao redor de 1910(sertão de Ceara,
Rio Grande do Norte e Paraíba) era o pequeno trecho musical, tocado a viola ou
rabeca (por ambas também), antes do verso cantado pelo cantador. Como na
cantoria do desafio clássico não havia acompanhamento musical, os trechos eram
executados antes do verso e depois, para o descanso do primeiro cantador e
pausa para o adversário preparar a resposta. Esse trecho dizia-se Rojão ou
Baião.
(Luis
da Câmara Cascudo,VAQUEIROS E CANTADORES, pag. 143, Porto Alegre-1939)
Foto Ana Maria |
A representação de nossas sonoridades, vem marcada pelo contato com a Natureza, estamos muito próximos de nossa Terra Brasil e assim dividimos este momento com vocês. Pelo olhar de Ana Maria as belas paisagens são compostas em nossas rotas, as quais, enriquecem o nosso contato. E assim estamos em clima de despedida do Porto Bate Pé ...
SAMBA DE TERNO – Os Reisados são
protagonista dos Ternos. Os coros são entremeados de palmas e bater de pés. Os
Reisados percorrem as ruas e estradas, á luz de archotes. O povo acompanha
saracoteando ao ar livre, as fantasias do bando. Os donos da casa facultam o
ingresso, ai restabelece-se o silêncio, e a saudação solene, religiosa e
profana ao mesmo tempo, irrompe o Rancho, com a musica a frente, dando-se as
mãos, requebrando, dançando, entram cantando:
Bendito louvado
seja
O Menino Deus
nascido
Que no ventre de Maria
Por nós esteve
escondido.
Dois de cá
Dois de lá
Mariquinhas no
meio
Não pode sambar.
E
dois a dois, volteiam pela sala, tomam o corredor, voltando e variando a Toada:
Há três dias que
eu ando
Procurando sem
achar
Mais fui dar com ele em
Roma
Vestidinho num
altar.
Inda bem
Há de vir
Que somos de
longe
Queremos nos ir.
Quando
havia Presépio em casa, os figurantes em passos alternados apresentavam suas
homenagens entoando:
Bravo, bravo,
bravo !
Hoje quem
brilha
O verbo humanado
Deus da
maravilha.
Na
véspera de Reis, os foliões de Santo Amaro, Cachoeira, Feira de Santana, Nazaré
das Farinhas, sulcavam as estradas em carros de boi em busca de engenhos e
fazendas nos quais iriam tirar Reis.
Na capital, os
grupos preparavam alegorias, e desde o escurecer retumbavam as sonâncias. Do
RioVermelho, Itapagipe, Barra, Papagaio, Bomfim, partiam Ternos. Cada qual
trazendo uma garça ou um pavão, com símbolo escoltados por crioulas e
capadócios, que percorriam as ruas em estripitoso alarido.
O Reisado ou Reis,
assim chamado por serem festas dos Reis Magos (6 de janeiro). O Reisado tem
lugar em uma casa de família. Esta casa fica com as portas fechadas e as luzes
apagadas.
Chegando a casa
determinada, moças e rapazes que constituem o Terno, cantam ao som das violas,
pandeiros entremeados por palmas.
Ô de casa,
gente nobre
Acordai
para saber
Que embora
gente pobre
Vem agora
vos dizer.
Ô de casa,
nobre gente
Acordai e
ouvireis
Que parte
do oriente
São
chegado os três reis. (...)
O
dono da casa acende a luz e abre a porta convidando o Reisado a entrar, e o grupo
entra cantando:
Dois de lá,
dois de cá
Sozinha no
meio não posso ficar
Meus compadres
nos manda servir
Pois somos de
longe, precisamos ir.
Bolinhos bem
feitos, feitos por Iaiá
A dona da casa
disse que nos dá
Docinhos,
confeitos e tudo que há
Queremos
moqueca e vatapá.
A
dona manda servir doces, bolos e licores, e a orquestra composta de sanfona,
violão, pandeiro e flauta, inicia o baile que vai até a madrugada.
As letras das Toadas
variam de lugar para lugar, assim é que em Feira de Santana o Reisado mais
cantado tinha estes versos:
Ô de casa, ô
de fora
Ô menino vai
ver quem é
É nos
cantando Reis
Quem mandou foi São José
São José,
Santa Maria
Diz que vai
para Belém
Diz que vai
cantar um Reis
E cantaremos
nós também. (...)
Viemos cantar
um Rei
Como se canta
na corte
Senhores donos
da casa
Deus lhe dê
uma boa noite.
Deus lhe dê uma boa noite
Alegremente
cantando
Com despedida
na festa. (...)
O
dono da casa acende as luzes e abre a porta, e o Terno de dois a dois iam
entrando e cantando:
Abre a porta e
também a janela
Queremos
gozar esta cor de canela
E
já na sala saracoteando e bamboleando cantam:
A dona da
casa, Léa é boa de dar
Ela tem peru, que vai
mandar matar.
Nos queremos
bolacha e café
Que saco
vazio não se pôe em pé.
A
Dança e Samba vão até a madrugada.
Os
Reisados são de procedência “Sudaneza” principalmente dos Gêges.
Os
componentes do Terno são chamados Pastores e Pastoras.
O
“Reisado” sempre foi uma festa do coração, através dele se cristalizaram as
mais puras amizades, e manifestações cordiais entre as famílias.
Distinguir
uma casa, nas noites de Reis, com grupos de lanternas de seda, castanholas e a
orquestra á frente, era um acontecimento luminoso para a família.(...)
(Zilda
Paim, RELICÁRIO POPULAR, pags. 70 a 76, Salvador-1999)
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