E vamos subindo e descendo ladeiras, que para cá, "todo o santo ajuda". Estamos aqui, no Recôncavo Baiano, ao lado, a veia que o Paraguaçu desenhou na rocha. E hoje, escorre lentamente ao aconchego das marés... Vejam que maravilha os ritmos que vamos distribuindo com a Mala do Folclore. Para nosso deleite vem aí os ritmos Aboio-Toada, Fadinho, Samba de Maculelê.
Aboio-Toada – “No fim da Toada, tôdas as pessoas da
lavoura, homens e mulheres, repetem em berro, demorando muito na segunda
palavra: Ei Boi !” (Gonçalo Sampaio, CANCIONEIRO MINHOTO, cap. XXIII).
(...)”Guiam-se as boiadas, indo uns tangedores diante, cantando, para serem
desta sorte seguidos do gado”. (Antonil, CULTURA E OPULÊNCIA DO BRASIL POR SUAS DROGAS E MINAS, pag. 268,
São Paulo, 1923).
“No sertão do Brasil o Aboio é sempre solo, canto individual, entoado livremente.
Jamais cantam versos, tangendo gado. O Aboio não é divertimento. É coisa séria,
velhissima, respeitada. Aboia-se no mato, para orientar a quem se procura.
Aboia-se sentado no mourão da porteira, vendo o gado entrar.Aboia-se guiando o
boiadão nas estradas, tarde ou manhã. Serve para o gado sôlto do campo e tambem
para o gado curraleiro, vacas de leite, mais em menor escala. Aboiar para vacas
de leite não é Aboio para um vaqueiro que se preze e tenha vergonha nas ventas. (Luis da Câmara Cascudo, DICIONARIO DO FOLCLORE BRASILEIRO, pag 2, Rio de
Janeiro, 1954).
“Sa figure s’illumine, je l’accompagne au parc. Il y entre en
sifflant doucement a bouche close, et les boeufs. Qui ont d’abord baissé. Lui
s’approche, circule au milleu d’eux, les caresse, les pousse, les fait avancer,
touner á son gré, les conduit hors de l’enclos, et le fusil á la bretelle,
appuyé sur un des animaux domptés me regarde, victorieux – “ y a paré, mon
licutenat”. “Se je ne l’avais
vu, je ne l’aurais cru”. (Baratier, EPOPÉES AFRICAINES, pag 95).
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Vaqueiros na Caatinga (Caribé ) |
Inácio da Catingueira
Por isso é cabra de fama,
Por isso sabe dançar
Por isso eu digo cantando:
Só lá se sabe aboiar !...
(Rodrigues de Carvalho, CANCIONEIRO DO NORTE, pags. 179 e 280, Paraíba,
1929.)
Fadinho – “Dai a pouco começou o Fado,
todos sabem o que o é o Fado, essa dança voluptuosa, tão variada. Que parece
filha do mais apurado estudo da arte. Uma simples viola lhe basta, melhor que
nenhum outro instrumento. O Fado tem diversas formas, cada qual mais
interessante. Ora é uma figura só, homem ou mulher. Que dança no meio da casa
por algum tempo, fazendo passos dos mais difíceis. Tomando as mais airosas
posições acompanhando-as com estalos de dedos e aproximando-se da pessoa que
lhe agrada, diante dela faz-lhe neganças e vira voltas, e finalmente bate
palmas, o que quer dizer que a escolheu para substituta. Assim corre a roda
toda, até que todos tenham dançado outras vezes dançam juntos um homem e uma
mulher seguindo com a maior certeza o compasso da música; ora a passos
apressados; depois repetem-se; juntam-se de novo; o homem ás vezes busca a
mulher com passo ligeiro a qual, fazendo um pequeno movimento com o corpo e
braços, recua vagarosamente; outras vezes é ela quem procura o homem, que recua
por seu turno, até que enfim voltam á primeira figura. Há também a roda em que
dançam muitas pessoas, interrompendo certos compassos com palmas e em sapateado
as vezes brando e breve, porém sempre igual e ritmado. A música é diferente
para cada caso, sempre tocada a viola. Muitas vezes o tocador canta em certos
compassos uma cantiga de feitura verdadeiramente poética. Quando o fado começa,
custa a acabar; termina sempre pela madrugada, quando não leva de enfiada dias
e noites seguidas”.
(Manoel
Antonio de Almeida, MEMÓRIAS DE UM SARGENTO DE MILICIAS, cap. VI
*( 1852 -1853).
Construindo o nosso mapa passamos pelos Engenhos de Santo Amaro. E aqui, na Cidade de Cachoeira , partiremos para a Estrada Real Estação Villa Velha ( Ramal Feira de Santana ). Enquanto isso apreciem o Samba de Maculelê.
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Tia Ciata |
Samba de Maculelê – (...) “Na minha infância convivi com
pretos e pretas que me contavam as suas estórias
Ouçamos o que
dizia a velha Pupu, que viveu mais de cem anos. Ela foi escrava do Engenho
Partido.
Quando eu era
pequena vi lá no Engenho Partido o escravo Ti-Ajou, batendo e tocando o
Maculelê. Quando se deu a liberdade eu já era mãe de fio e vó de neto. Cutú só
tinha um filho, o Manoel que por ser muito feio era apelidado de Mané Beiçola.
Pelas contas feitas o Manuel nasceu em l844 e aos oitos aprendeu Maculelê com
Ti-Ajou. Logo as minhas pesquisas iniciam-se no ano de 1852.
Temístocles,
era um preto que conheci também, foi aluno de Ti-Ajou. O preto João Ferreira
dizia: “eu já nasci forro mas aprendi a tocar Maculelê no Partido”.
Eis o que me
contaram:
Na Àfrica os
negros lutavam empunhando dois pedaços de paus, que eles chamavam de lelês.
A rivalidade
era intensa entre os Macuas e os Males estes últimos armavam-se com paus e
diziam: “vamos esperar Macuas a lelê”. Disto talvez se origine o nome Maculelê.
A expressão
“Macuas a lelê” sofreu uma corruptela dando origem a palavra Maculelê.
Sabemos que
somente em dois engenhos se iniciou o Maculelê: o Engenho São Lourenço de
propriedade do Visconde de São Lourenço, cujo proprietário não permitia que os
negros usassem cacetes.
O Engenho Partido, cujo
proprietário era Joaquim Pereira consentiu que a brincadeira fosse praticada na
Senzala para disfarçar a luta Ti-Ajou deu música e ritmo ao Maculelê.
(...) “Com a
intenção de promover a sua defesa e liberdade os negros tiram pedaços de paus
nas matas e na Senzala, começando os treinos. Logo foi proibido, pois achavam
que iria causar grandes prejuízos e apresentaria perigo para a economia da
região e para a pátria.
Muito ladino
Ti-Ajou achou uma maneira de camuflar, e introduziu a música e a dança. – como
brincadeira e dança agradou até ao dono do Engenho que cedeu e consentiu que
fosse dançado na Senzala em horas de folga.
Foi
improvisado um timbale com um tacho furado do Engenho; agogô e chequerê. A
batida dos cacetes ajudavam o ritmo.
As Cantigas
foram sendo adaptadas. E como o negro em tudo demonstrava a sua fé, saudavam os
seus deuses, ou tudo aquilo que merecia o seu respeito e adoração. Ti-Ajou era
também pai de terreiro e com tal sabia as normas e rituais do Candomblé “(...).
(Zilda Paim, RELICÁRIO POPULAR, pags. 17 e l9, Bahia, 1999.)
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