O Boi – Pelas regiões da pecuária vive uma literatura oral louvando o boi, suas façanhas, agilidades, força, decisão. Especialmente no nordeste.
Onde outrora não havia a divisão das terras em cercas de armas, modificando a fisiologia social dos agrupamentos, motivando a fisionomia social dos agrupamentos, motivando uma psicologia diversa, os bois eram criados soltos, livres, nos campos sem fim.
Novilhos eram beneficiados: ferra, assinalação na orelha, castração, cada ano os vaqueiros campeavam o gado para a apartação, separando-se as boiadas segundo os ferros e a inicial da ribeira, impressa a fogo na coxa.
Alguns touros e bois escapavam ao cerco anual e iam criando fama de ariscos e bravios. Eram os barbatões invencíveis, desaparecidos nas serras e várzeas bebendo em olheiros escondidos e sesteando nas malhadas distantes.
Vaqueiro destemidos iam buscar esses barbatões, com alardes de afoiteza e destemor. Vezes, o boi escapava e sua fama crescia pela ribeira. Cantadores encarregavam de celebrizar suas manhas, velocidade e poderio.
Outros cantadores levavam, cantando, esses versos para outras regiões. O boi ficava célebre. Um dia, inesperadamente, um vaqueiro ou um grupo surpreendia-o, corria horas e horas em seu encalço, alcançando-o, derrubando-o, pondo-lhe a máscara e trazendo-o ao grito do aboio vitorioso, para o curral, como não era possível conservar esse animal fugitivo e feroz, abatiam-no a tiros, aproveitando a carne.
Novas cantigas narravam sua captura, a derradeira batalha e o sacrifício, nalguns versos o boi era transfigurado, tornava-se gigantesco e o cantador, humoristicamente, fazia a divisão dos melhores e piores com as pessoas conhecidas da redondeza.
Bois, touros, novilhas, vacas, o ciclo do gado, possuem suas gesta gloriosa. O boi Barroso nos pampas do Rio Grande do Sul possui suas réplicas em todo nordeste pecuário, versos que atingem aos fins do séc. XVIII, em quadras sextilhas soltas ou na forma abecedária imortalizam essas aventuras.
Silvio Romero (CANTOS POPULARES DO BRASIL) registou o Rabicho da Geralda, o boi Espácio (versão do Ceará e outra do Sergipe), a vaca do Burel, o boi Surubim, o boi Prata;
Pereira da Costa (FOLCLORE PERNAMBUCANO), o boi Espácio, vaca do Burel, o boi Liso;
Gustavo Barroso (AO SOM DA VIOLA), o boi Moleque, o boi Misterioso, o novilho do Quixelô;
Rodrigues de Carvalho (CANCIONEIRO DO NORTE), Rabicho da Geralda, o boi Vítor, o boi Pintadinho, o boi Adão;
A. Americano do Brasil (CANCIONEIRO DE TROVAS DO BRASIL CENTRAL), décima do boi, variante do boi Surubim, boi Amarelo, boi Chita;
Luís da Câmara Cascudo (VAQUEIROS E CANTADORES), ciclo do gado, vaquejadas e apartações, gesta de animais, solfa do boi Surubim, romance do boi da mão e do pau.
Luís da Câmara Cascudo (DICIONARIO DO FOLCLORE BRASILEIRO), pag. 105, Rio de Janeiro – 1954.
Cartaz do "Cine Madri" (Feira de Santana-Bahia) - Nestor Vieira
Cinema Paris
Cachoeira - Bahia
Cinematographe
Rue du Havre - Jean Beraud
Salvador - Bahia
Passeio - Rio de Janeiro
Cine Movie
“No decorrer dos anos 40, principalmente os cinemas de bairro (chamados
de poeira), que ofereciam aos domingos e feriados sessões vesperais, também
conhecidas como matinês, viviam seus momento de glória. A cada ano que passava
novas salas eram inauguradas, para se juntar as já existentes nos mais diversos
pontos da cidade de São Paulo. Estes cinemas, bem mais modernos, com poltrona
de madeira, cujo sistema de ventilação e renovação do ar não existia, tinham,
porém um publico fiel entre os moradores das redondezas que normalmente lotavam
suas sessões, fossem elas vesperais ou soirées.”
“Era uma forma que pessoas de baixos recursos financeiros dispunham,
para poder assistir também aos filmes exibidos nos cinemas lançadores, cujus
preços eram bens mais caros, embora com algumas semanas de atraso.”
“Apesar de quase todos eles disporem em média de mil lugares, nos fins
de semana, por falta de opção ou imaginação, multidão de adultos e crianças
compareciam lotando as matinês desses cinemas. Por ser o meio de diversão mais
barato, chegavam a lotar muitas vezes as salas de projeção acima do limite.
Forçando muitos a se sentarem no chão ou nos degraus das escadas, a programação
destas matinês era quase sempre voltada para o gosto das crianças, com a exibição
de um ou mais westerns, capítulos de seriado, comedias, policias, ou uma nova
aventura de Tarzan. Quem conseguia entrar, depois de aguentar uma fila
quilométrica para comprar o ingresso, não parecia se importar muito com as
lamentáveis condições de muitas dessas casas de espetáculos. O que valia mesmo
era ver como o “mocinho” amarrado nos trilhos pelo vilão no episodio anterior,
iria se salvar do trem que vinha em disparada.”
“Paralelamente a satisfação que nos causava assistir os westerns e
seriados durante as matinês, estava o comércio de “gibis”, que acontecia nas
portas desses cinemas, momentos antes do inicio da sessão. A garotada já sabia
que além do dinheiro para o ingresso, tinha que sobrar alguns tostões para os
gibis.”
“Para uma família de classe média ir aos grandes e luxuosos cinemas do
centro de São Paulo, nos anos 40, o pai colocava terno e gravata(obrigatórios
para a entrada em determinados cinemas) e a mãe colocava um dos seus melhores
vestidos. A criançada já ficava pronta e entusiasmada com a ideia de ver os
desenhos animados que precediam os filmes. Depois do cinema, a família passeava
no centro da cidade, para ver as vitrines de lojas e tomar sorvete, antes de
voltar para casa, este ritual se repetia varias vezes durante o mês. Segundo
estatísticas da época, o paulistano ia ao cinema pelo menos 15 vezes ao ano.”
“Muitos cinemas do centro da cidade funcionavam com seis sessões
diárias: ás 12, 14, 18, 20 e 22 horas. Com cartazes luminosos e letreiros
fulgurantes, as salas de exibição daquele tempo tinham uma concepção quase
hollywoodiana, além de serem bem maiores. Quase todos tinham capacidade para
acomodar mais de mil espectadores. O “Paissandu” tinha mais ou menos, dois mil
lugares e o cine “Universo”, que nem era no centro, tinha mais de quatro mil.
Eram cinemas lançadores, frequentados por grande parte da elite paulista e
ficavam no centro da cidade, numa zona
conhecida como a Cinêlandia.”
“Mas não era só na capacidade que os cinema de antigamente eram
diferentes. Muitos deles tinham no seu interior estátuas e espelhos, além de
bela arquitetura e muito conforto. Infelizmente hoje em dia eles só existem na
memória de seus ex-freqüentadores.”
(Trechos do capitulo “OS CINEMAS” do Livro “NO TEMPO DAS
MATINÊS – EMOÇÕES NO CINEMA DE BAIRRO”, de Diamantino da Silva, Umberto Losso e
Kendi Sakamoto. Editora Laços – 2007, São Paulo.)
Salas de Cinema de São Paulo
Royal Cine - Portugal
Feira de Santana - Bahia
Cine Guarany - Salvador-Bahia
The Jazz Singer
Cine Brasilândia - Centro Cultural de São Paulo
Cine Iris - J. Nogueira (Feira de Santana - Bahia)
Tabaréus, mascates, comedores de fogo, propagandistas, violeiros,
improvisadores, vendedores de pássaros, domadores de macaco, todos se
distribuem na imensa faixa calçada que vai da loja Pires, na rua Direita,
atravessa as praças João Pedreira e da Bandeira, até perder-se na cabeceira da
avenida Getúlio Vargas. Além da esquina do Santanópolis, além da rua do Sol
.
A
massa humana em movimento, em transações. E senhoras e senhores, conheçam a
estória em prosa e verso das façanhas do Lucas da Feira. O aviso é um alerta na
multidão, o poeta popular desloca-se agilmente em meio aos espectadores,
coloca-se no centro da roda. Quem sabe ler que leia dessa literatura, quem não
sabe que ouça de ouvidos bem abertos.
Festas, fogos de vistas, luminárias.
Gentes de longe chegam para ver. O maior cangaceiro do sertão baiano, vinte
anos de mortes, assaltos, fugas, combates, perseguições, o fim na forca. Seu
pai de criação, um padre; nascera de mãe escrava. Salteador, escreveu não leu,
pau comeu. Começa com ele o ciclo do cangaço nordestino. Vem ver, gente, a
estória de Lucas da Feira. Os amores de Lucas. O porquê do Limão. Dom Pedro
Segundo não resistiu á tentação de conhecê-lo. Palácio Imperial, um visitante
de fama singular. Protocolo? Dispensado. Atenção, Dona Teresa Cristina
desmaiou, cruz credo, esse é o Lucas da Feira? O último pedido, o chilique da
Imperatriz, a pena confessada do Imperador. O último pedido. O foguetório. O
corpo do Lucas a balançar na forca.
Da esquina do Ginásio
Santanópolis até o colo do Ponto Central. Além das cercas dos Celestinos, uma
reta só em chão batido, a poeira, a feira seguindo seu curso que nem rio, com
nascente e foz, fluxos que se estendem e se reencontram, que refluem, estágios
superiores, médios e inferiores, leito ora manso. Ora acidentado, margens, a
feira dividida em espaços de frutas, cereais, carnes, sacaria, cerâmica,
farinha, aves, cestarias, trançados, peças de corte e de tiro, perfumarias,
panos, tecidos finos e grossos, artigos de ferro, artesanato sertanejo, talhas,
porrões. Potes, resfriadores, vasos, adornos. O barro cru e queimado, seções de
frutas, tamarindo, abacaxi, fruta-pão, manga, umbu, laranja, seções de peixe,
de água doce e salgada do mar.
Sons criadores emergem do alarido
da feira. Sons de berimbau elevam-se. (...)
Mais
rodas se formam espontâneas, capoeiras, pretos de peito nu e calças brancas ensaiam
passos, aprimoram escolas. Jogo ligeiro, camarado no coração da feira. São
Bento Grande, Mestre Muritiba.
Besouro quando morreu
Abriu a boca e falou
Que o mundo vai se acabar
A canga fica pro chamador
E no dia do dilúvio
O mundo todo paralisou.
Viado perdeu a tria
Tatu no buraco entrou
E o cago foi dizendo
Ai, meu Deus pra onde vou?
As vozes seguram, então, o estribilho:
Ei, zum, zum, zum,
Capoeira mata um
Ei, zum, zum, zum,
Capoeira
mata um.
Mestre Muritiba entra novamente:
Atirei
num cutia
por cima duma cancela
Quando a cutia caiu
eu caí em cima dela
Tirei o couro, espichei
e fiz uma capa de sela.
Se você tá duvidando
pergunte ao Loreano
que anda montado nela.(...).
Havia ainda uma feira menor, em sentido horizontal, intercalada nas ruas
que cruzam a praça João Pedreira e a avenida Getúlio Vargas. Mais ou menos
doméstica, do povo dos subúrbios, dos pobres do Centro que trazem suas garapas
de cana, limão, laranja, maracujá, mangaba, bordados, miudezas caseiras,
baratas, para perto dos negociantes de artefatos de couro, chinelos, alparcatas
Maria Bonita, bijuterias, redes de cabelo, armarinhos, da rua Salles Barbosa
principalmente. Do Mercado Municipal aos arredores do Cassino do Lindinho
Labareda, banqueiro do jogo do bicho e do jogo do amor, mulheres da vida
passeiam seus brincos de vidros, seus balangandãs encomendados na Bahia, suas
jóias multicores – essa feira recria encantos. (...).
A
feira ferve na segunda-feira, a feira urbana, do comércio doméstico. Entre essa
feira, que antes já foi na terça e que agora começa verdadeiramente na sexta á
noite, atravessa o sábado e o domingo, para esgotar-se na segunda – entre essa
feira e a feira do gado, na Queimadinha, Florêncio se movimenta, se agita se
realiza. E quem não há de?.
Do
Missuíça ao Dálvaro do Amor Divino, todo mundo se encontra e se reencontra na
feira, para comprar ou para assuntar, para falar ou para ouvir, para aprender
ou para ensinar. Venha, venha à Feira de Santana numa segunda-feira, com seus
tabaréus, seus sertanejos, seus matutos, seus forasteiro, seus comerciantes,
seus pensadores, seus poetas, seus sábios, seus macumbeiros, seus oradores,
suas mulheres, seus artífices, seus mestres, seus negociantes, seus coronéis. E
fique para a micareta, a maneira daqui de ser carnaval, a micareme. Há os
Fantoches, a Cruz Vermelha, os Gaiatos do Mercado e as Melindrosas da
Queimadinha.
Nessa
feira do comércio doméstico, da praça João Pedreira à avenida Getúlio Vargas ou
na Feira do Boi, a do Campo do Gado, os tabaréus chegam de léguas afastadas,
descem de serras distantes ou sobem caminhos acima do sertão, de chapadas e de
terras estorricadas, com seus frutos, os frutos da terra trabalhados por eles.
Suas esteiras, suas cestas de pindoba, seus artefatos de sisal, os objetos de
barro cozido, sua arte rude, barata, herdada dos mamelucos, dos índios, dos
pretos escravos que povoaram Santana dos Olhos D’ Água.
Esses
homens, mulheres e crianças que movimentam suas ilusões construídas em suores
de três dias em cada semana, para estar na Feira de Santana, sexta-feira e
dormir ao relento, na frieza, a esperar o comprador, habitam choupanas com uma
ou duas aberturas que servem de porta e janela, são casas de taipa, com paredes
de barro, o barro atirado com a mão, no tapa, pedaços de madeira, alguma areia,
algum cal.
São pobres
como os pretos, tão pobres quanto os pretos e assim, embora brancos ás vezes de
olhos verdes, azuis, os que assim são também como pretos são tratados porque
são pobres, chegam e saem, entram e saem da feira como anônimos, entram na
cidade silenciosos, com seus objetos na cabeça, ou nos ombros, ou na carroça,
ou na cangalha dos animais, dos poucos animais que têm para carregar seus
produtos e voltam, montados ou a pé, a cada semana, vêm e voltam com seus
trastes, as sobras da feira, com pequenas aquisições, o que deu com o dinheiro
ganho, juntos, unidos na volta como na ida, para suas casas de palha e taipa,
onde dormem e acordam com muitas juras mas sem muitas esperanças, onde dormem e
comem e vivem juntos, sobre o chão batido, ai procriando, em cima da esteira,
do pano ralo a forrar o chão batido, muitas vezes sobre palhas estendidas como
tapetes, lençóis ou toalhas, para comer e dormir. Homens, mulheres e crianças,
pobres absolutos, que vivem como bichos, entre seus cavalos, seus porcos, seus
cachorros, seus gatos, seus enganos, suas efemeridades, mas não sua felicidade.
Alguns desses
homens e mulheres, crianças da roça que se fizeram adultos, vivem como bichos,
sem luz, suas carências, suas necessidades, rompem a união e não regressam. O
pai-de-santo, o aguadeiro, o carregador, a mulher da rua do Meio ou o operário
da olaria que conseguiu um lugar de ala das Melindrosas, são ex-tabaréus,
ex-matutos que se inserem na humanidade de Feira de Santana, entre os
piauienses, os alagoanos, os sergipanos, os pernambucanos, os de toda parte que
se atropelam nas ruas e avenidas novas, nas vias da febre do crescimento da cidade, nos ramais do boi, no Campo do
Gado.
Uma vez ou
outra, pela mão de um coronel ou de um liberal, um desses homens ou mulheres
ingressa na sociedade, confraterniza, distribui cartões de visita e disputa preferências
– mas, o coronel Farinha ou o Dr. Bonfim, como bons patriotas, logo advertem
para a origem humilde, até há pouco tempo eram simples matutos, tabaréus, hoje
têm a vida feita, são felizes, são felizes.
Viado
perdeu a tria
Tatu no
buraco entrou
E o cago
foi dizendo
Aí, meu
Deus, pra onde vou?
O som da
capoeira, o som da feira, de Mestre Muritiba, letra e melodia, se faz eco,
acompanha os passos de Florêncio.
Ei, zum,
zum, zum,
Capoeira
mata um
Ei, zum,
zum, zum,
Capoeira mata um.
Ele vai andando e
cantando, trauteando, trauteando. E quando a segunda-feira nada dá ou dá muito
pouco, os recados, as encomendas, os mandados, Florêncio espera pela terça e se
junta aos carroceiros que com suas carroças vão recolhendo pelos caminhos,
picadas da Queimadinha, nas trilhas do Campo do Gado, do Matadouro, do boi,
boiada, a bosta que ficou ao chão para o sol secar, a secar, a ser recolhida
para vender como esterco. As carroças da bosta, do estrume, do dejeto do boi,
recolhem e vendem nas fazendas, nas plantações, para o esterco, para a riqueza
da terra, os laranjais, as lavouras de frutas e cereais, vai andando e
cantando, trauteando, trauteando, que mais há para fazer? E é pouco? Vida,
vida, bela vida, vidaça.
- Hem,
Florêncio, vamos à bosta amanhã?
É o Pulinho, filho de criação de Tom Palanque, quem pergunta.
- Amanhã tem
bosta?
- Tem.
- Então, vamos.(...).
Juarez Bahia: SETEMBRO NA FEIRA. (Romance). Págs.: 148, 151,
156 a 160. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1986.
Carybe - A Feira
Carybe - A Feira
Carybé - A Feira
Carybé - A Feira
Carybé - A Feira
Carybé - A Feira
Carybé - Cipó.(Zabumba)
Carybé - A Feira
Carybé - A Feira
Carybé - A Feira
Carybé - Sem Titulo
Carybé - A Feira
Carybé - A Feira
Carybé - Retirantes
Carybé - Boiada - SALÃO DE AUDIÇÃO -
A Feira. (Samba) Àlbum : Minha Terra Bom Dia... Obrigado pela Companhia !!!